Os Mentis Afro são um grupo da linha de sintra, que tem vindo a surpreender com a sua mensagem e desempenho pela cultura hip hop. Com um álbum mas ruas e cheios de projectos, já construíram o seu espaço.
Falem sobre o projecto Mentis Afro.
Ghoya- Para que as pessoas percebam quem são os MA temos que explicar como surgiu o projecto e que não somos um grupo de intervenientes do Rap que resolveu participar numa compilação ou algo do gênero.
Como começou tudo?
Ghoya - Quando regressei da reclusão já possuía a base do projecto que, inicialmente, tinha o nome Universu Afro. Voltei ao activo, uma semana depois de ter saído da prisão e dirigi-me junto do Boss a fim de o convencer para que fizesse parte do grupo. Eu e ele éramos do mesmo ghetto, Bairro das Fontainhas. Depois de algumas impressões e freestyles o Boss informou-me que a sua irmã Yaroshima, também fazia rap. Como era uma jovem que tinha muito a dizer, o Boss só teve que puxar um pouco por ela, que acabou por se juntar a nós. Seríamos assim, os primeiros membros dos Menti Afro. Escusado será dizer que já estava pré destinado que os restantes membros fossem Editox, Moreno, Dibela, Kamé, Souzha, Fénix e Manga. Todos estes membros fazem parte do projecto desde a raiz. A base dos Mentis Afro é respeito e entreajuda, tanto a nível pessoal como profissional.
Algumas músicas do álbum do Ghoya já eram do grupo Mentis Afro?
Ghoya - Sim, Novus tempus otus muves, kriolurap e diturpa nós storia gravadas pelo grupo e divulgadas no meu álbum Di Otu Ladu Lei em 2007/2008, álbum que ia ser lançado pela editora Sonoterapia, mas que não foi avante devido a problemas internos. Por esta altura, MA já pensavam em algo maior do que só 3 faixas. Decidimos todos que o grupo precisava do seu próprio espaço e é aí que o Editox e Moreno se juntaram ao grupo, ambos já com vasto conhecimento no Rap.
Que músicas o Editox produziu para Mentis Afro?
Moreno - É um excelente produtor. O álbum Mundo Infernal é produzido por ele, para a Mentis Afro Records, com excepção de Koka Dhomis, Nmesti Nha Pistola e Bus Fidjus Kre Odjau. Não começou mal.. as ruas sabem.
Qual a tua função nos MA, Moreno?
Moreno - Divulgação e relações públicas, design, organização, fotografia, vídeos.. Tenho contribuído com produções de instrumentais para o grupo.
Como vêem o movimento e se integram nele?
Moreno - Vemos o movimento a crescer tanto no bom como no mau sentido, embora faça parte. Integramos o movimento da mesma forma que o movimento se integra em nos. Quando nos é dado amor, contribuimos com amor a dobrar, quando nos é dado ódio, contribuimos com ódio a dobrar. Nós somos o mundo no qual vivemos e contribuimos da forma que está vista. Ti kaba na nada.
O vosso álbum é muito diversificado e focam a vossa vida no bairro. De que forma influencia ela o vosso rap?
Boss - Em tudo. Desde o facto de eu ter perdido pais e irmãos cedo, de ter passado pelas dificuldades que os nossos patrícios passam na nossa comunidade. Na exclusão social, no abuso policial e nas cicatrizes que nos marcaram na perda dos nossos manos na mãos da polícia. Até à força de vencer e à vontade de viver, mesmo estando a sofrer.
Que tipo de mensagem querem transmitir e a quem se direccionam?
Ghoya - Pretendemos transmitir a verdadeira justiça, liberdade, igualdade, num mundo infernal em que todos queremos assumir as nossas diferenças e não a nossa igualdade, na qualidade de ser humano para com o próximo. Nós direccionamo-nos ao público de todas as faixas etárias e etnias. Seria hipócrita da nossa parte dizer que não nos focamos um pouco mais nos problemas que nos rodeiam e com os quais lidamos no dia a dia.
Como estão a correr as gravações do 2º álbum?
Moreno - Graças a Deus está em curso. Está previsto sair no inverno, aquecendo espiritualmente todos os amantes do rap.
Ghoya, também estas a gravar um álbum a solo?
Ghoya - Sim. Graças a Deus, as coisas têm estado a correr como têm de correr. Entro no estúdio focado no meu trabalho, faço o que tenho a fazer, sem pensar em pisar alguém ou passar à frente, mas sim reconhecer que atingi os meus objectivos. Não tenciono estar aqui a brincar e dizer às pessoas 'Ya o Rap é fixe e é o melhor gênero musical'. Não quero desrespeitar os outros gêneros de música, mas também não quero ser desrespeitado.
Em relação ao rap crioulo?
Ghoya - Sim, já agora, aproveito para dizer q a expressão Rap Crioulo só começou a ser mais usada quando o rap deixou de ser algo geral em Portugal. É mais do que óbvio que grande parte dos protagonistas do rap crioulo sente necessidade em rotular-se, pois são excluídos do movimento. Muita gente usa o pretexto do dialecto e o contexto social para marginalizar o nosso rap. Tenho estado a trabalhar no meu próximo álbum e não vou ser elitista, vou ser o mais abrangente possível para chegar a todas as faixas etárias, étnicas e religiosas de Portugal. Vou ser sempre eu a tentar evoluir como ser humano. Estou muito satisfeito por estar a gravar o meu 4o projecto a solo.
Ghoya muita gente te compara com o 2pac. Que tens a dizer sobre isto?
Ghoya - É claramente um motivo de contentamento ser associado a uma lenda do Rap. É um excelente rapper é só tenho de estar feliz. Há quem ache que sim e quem ache que não. Não ficarei melhor comigo por causa dos que acham que sim, nem ficarei pior por causa dos que acham que não. Aos que me acham parecidos com o Shakur um obrigado por apreciarem o meu trabalho ao ponto de me compararem com um tão majestoso rapper. Aos que são de outra opinião um obrigado também,porque essas opiniões me estimulam, sejam negativas ou não. Não sei o que é melhor ou pior nisto tudo, porque não estou nem aí, mano. O importante é nunca esquecer quem sou e o que represento. As pessoas pensarem que isso tem um impacto extremo naquilo que faço é irrealista. O Ghoya será sempre o Ghoya.
Yaroshima, és das Mcs mais jovens do movimento. Como te sentes?
Yaroshima - Normal. Faço o que gosto sem dar importância à minha idade. Penso que se me agarrar ao facto de ser das mcs mais jovens no movimento estarei a comparar-me com algo ou alguém. Não comparo trabalhos, como também não comparo o amor. Estou no movimento por amor, por isso o factor idade não é o mais importante. Dá-me mais força para continuar a tirar partido do que o facto de ser mais jovem, mais anos de percurso pela frente, para aprender a evoluir como rapper e pessoa.
Será que tiveste de crescer muito rápido devido a problemas na tua vida. Achas que o HipHop te ajudou a enfrentar alguns desses problemas?
Yaroshima - Sim, ajudou, mas nos primeiros passos penso que foi ao contrário. O início da minha caminhada no movimento rap foi devido ao meu difícil percurso de vida. O exemplo a seguir foi o meu irmão Boss. O facto de ter crescido rápido quebrou dificuldades e barreiras para expressar certos acontecimentos que me marcaram ao longo dos anos. Hoje, é esta envolvência com o HipHop/Rap que me ajuda a ultrapassar certas dificuldades, barreiras, momentos difícieis, tristes e infelizes. O facto de fazer rap e o sentir eleva-me a alma e fortalece-me psicologicamente. Sim! O rap ajudou-me a encarar e a enfrentar os diversos problemas.
Boss, qual foi o benefício que tiraste ao ter participado no projecto Putos Qui A Ta Cria?
Boss - Foram vários. Desde a troca de experiências ao conhecimento de outras realidades, à oportunidadde de trabalhar com outros mcs de diferentes comunidades e bairros, até ao benificio de participar num projecto com uma dimensão reconhecida além fronteiras. Este projecto teve um papel importante na minha caminhada como mc e como ser humano, por ter trocado experiências com outros manos do movimento. Agradeço a todos que estiveram em torno do projecto, pelo modo positivo ou negativo com que me deram a conhecer as vàrias facetas do ser humano.
Qual era o objectivo desse projecto?
Boss - Era chegar ao público alvo (crianças, adolescentes e jovens) dando a conhecer as nossas e outras realidades., alertando para os perigos que correm e informar sobre os nossos direitos e deveres.
Sei que também estás envolvido em projectos de solidariedade social?
Boss - Sim, é um que está em curso para se realizar brevemente e tem o nome Tudu Ta Midjora. Neste projecto todos nós podemos contribuir. com pequenos, mas significativos materiais escolares. Não iremos focar-nos apenas na educação, mas também no bem estar das crianças, joves e adultos. Relembro que este será o 1º passo de muitos que poderão surgir com o apoio e força de vontade de cada 1, para contribuir para o sorriso de muitas crianças.
Sobre o teu álbum a solo?
Boss - Vou começar a trabalhar em breve e terá o nome Mundu Ta Da Volta. Aproveito para dizer que o meu trabalho vai retratar algumas situações e fases da minha vida, desde o meu nascimento num estabelicimento prisional, aos problemas que enfrentei durante o meu crescimento. Quero transmitir força, esperança e moral, a todos os que estao a passar por estas ou por outras situações desagradáveis. Não se deixem abater porque enquanto há vida há esperança e lembrem-se que nunca devemos deixar de acreditar naquilo que queremos porque o mundo ta da volta. O importante é que se esteja sempre consciente da nossa realidade e onde podemos chegar.
Palavras finais.
Ghoya - Queremos agradecer a todo o pessoal que tem marcado presença nos concerto, sites, etc... que nos abordam nas ruas e que têm demonstrado amor e afecto.
Boss e Yaroshima - Aos nossos falecidos pais, ao rap que nos tem dado forças para sobreviver mesmo sem eles e a todos os manos/as que tem dado apoio ao movimento.
Moreno - Um grande obrigado à revista pela oportunidade de dar a conhecer a família Mentis Afro. Esperamos que continuem por muitos anos. Ao pessoal do HipHop Sou Eu. Para os tropas de cana, mantenham a cabeça levantada, como disse o tropa Ghoya Alegria Ta Ben di Manham. Não percam a esperança, um dia a liberdade chegará para todos os que lutam para um 'pão-nosso' de cada dia e para todos do movimento HipHop, quer por dentro ou por fora. Só com unidade e luta poderemos levar o HH além fronteiras, para que possam ouvir a nossa intervenção.
Entrevista Revista Freestyle Magazine
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