segunda-feira, 12 de outubro de 2009

“Ginga e fala gíria, gíria não, dialeto” Por: Gisele Coutinho



Artistas reunidos no palco do Dialeto, por Janaina Castelo Branco

Artistas reunidos no palco do Dialeto, por Janaina Castelo Branco

Eles gingaram no palco e falaram gírias, ops! Gíria, não, dialeto! O nome do festival independente de rap nacional que abalou a estrutura do Hole Clube (Rua Augusta, Jardins, SP) na noite de 10/10 foi inspirado no rap “Negro Drama”, dos Racionais MCs, e muito bem representando no palco pelos artistas Akira Presidente (RJ), Criolo Doido, Emicida, Kamau, Max B.O., Pentágono, DJ Dandan, DJ Marco, DJ Nyack e DJ Erick Jay.

A ideia de fazer um festival era antiga, mas tomou força com uma vontade que surgiu no dia do show de lançamento da mixtape do rapper Emicida, em um momento em que alguns artistas estavam ali, no mesmo lugar, no Hole Clube, espaço dirigido por Lu Brandão, uma das poucas pessoas responsável por um clube de São Paulo que acredita na força do rap nacional. Ela entregou o comando de algumas noites nas mãos de DJ Marco, que investe em shows semanalmente na casa. “O Hole não é uma casa de show, mas é o espaço que abriu as portas pra nós e não podemos perder essa oportunidade”, explicou o DJ durante a coletiva de imprensa do Festival Dialeto (confira fotos da coletiva realizada no Matilha Cultural).

Mas o NOIZ está aqui pra falar sobre o show, então, vamos lá. Bem antes da uma da manhã, casa lotada, sem grandes problemas com filas, pessoas simpáticas para receber o público na porta, casa cheia. A qualidade do som era excelente sob o comando de DJ Roger (Potencial 3 e Estúdio Ateliê). O público não arredava o pé da pista, mesmo com todo o calor. Normalmente, a parte de cima do clube fica lotada, desta vez, a pista fervia com os raps tocados por DJ Dandan e DJ Marco.

Artistas se abraçam. Celebração da amizade, por Luciana Playmobil

Artistas se abraçam. Celebração da amizade, por Luciana Playmobile

Aliás, o público do rap nacional, ao menos em São Paulo, mudou, e essa mudança é um grande avanço. A estudante de uma faculdade procurava um comprovante de que o festival aconteceu para uma disciplina complementar. Adolescentes com piercing na boca, cabelo liso e franja se aglomeravam nos cantos do clube, produtores de cinema, jornalistas, outros artistas também marcavam presença, mostrando que a música une pessoas de classes sociais e estilos diferentes. Até aí, metade da missão já estava cumprida.

Uma da manhã e entra no palco a primeira atração: Akira Presidente e DJ Alves nos toca-discos. Mesmo rimando para o público paulistano que ainda não conhece bem suas letras, o MC carioca arrancou o refrão em alto e bom som com a primeira das três músicas prometidas, “Bem Antes de Querer Rimar” (Roc Boys). Depois veio “Minha Área”, seguida por “Quer Dindin?”. O MC animou o público com sua presença marcante no palco e mandou, para fechar sua apresentação, a dançante “Mexe Mina”, emendando com o refrão de “Time do loko tá na casa”, do Pentagono.

No intervalo entre as apresentações, a expectativa do próximo show era animada pelos DJs da festa. No palco, preocupação com a organização do evento. Sob as luzes, Max B.O. entra e o MC Rappórter dá seu recado depois da primeira música: “Tenho duas notícias, uma boa e outra ruim. A boa é que gosto muito de vocês, a ruim é que hoje vou cantar só música nova”, disse o MC, referindo-se aos fãs que gostariam de cantar junto suas canções. Mas, notícia ruim que nada, afinal, todos curtem novidades, ainda mais ao vivo.

Max rimou três sons, fechando com “Fortaleza”, que tem no refrão a frase do rei Bob Marley: “A vida é para quem topa qualquer parada. Não para quem para em qualquer topada”.

É a vez de Criolo Doido se apresentar e jogar seu balde de água suja. Ao lado de DJ Kiko (Pentagono), André THDrez e DJ Dandan dobrando, o rapper percebeu o momento que vivia naquela noite. “Deus abençoe o Sistema Negro, RPW e outros grupos de rap”, mandou seu salve. “Chega de ser um peão nesse tabuleiro”, disse Criolo. O público eufórico entrou definitivamente na magia do Festival Dialeto e Criolo mandou logo “É o Teste”, seguida por “Grajauex” e “Vasilhame”. Em uma das letras, a frase cabia perfeitamente para o sucesso da noite: “Essa é pra você que desacreditou no meu rolê”.

O relógio marcava 2h40 (ao contrário, 4:20 para quem entender o recado e matar a charada da próxima apresentação). Para consolidar a euforia e alegria do público, entra no palco o grupo Pentágono, com versões um pouco diferentes de suas músicas mandadas uma atrás da outra, sem tomar fôlego: “Namoral”, “Swing”, “Time do Loko”. Rael da Rima puxa o refrão de “Parece Que Foi Ontem” em acapela e as mais de 500 pessoas presentes incendiaram a noite. Atendendo a expectativa, Pentágono mandou mais de três músicas, fechando uma das melhores apresentações da noite com o pedido para o público levantar seus celulares e isqueiros e cantar junto “Pelo o Que Eu Sei” e “O Moio”. Nessa hora, os artistas que já haviam se apresentado invadiram o palco. “Hoje é um dia histórico na vida de todo mundo aqui”, disse Rael no final da apresentação.

Quando o show acabou o teto do clube pingava. Era a prova de que a estrutura do local realmente não aguenta shows de grande porte e que público não falta para curtir rap nacional, o que falta é a vontade de empreendedorismo de endinheirados que podem ganhar ainda mais, só que investindo em cultura hip hop de qualidade em nível elevadíssimo.

Três e vinte da madrugada. De um lado do palco do Dialeto, DJ Nyack, o DJ de Emicida. Do outro, DJ Erick Jay, do rapper Kamau. Qual é a bola da vez? Aí vem a surpresa. Em um momento histórico do rap nacional, celebrando a amizade tão falada pelos organizadores do Festival, DJ Marco e Pedro Gomes, entram juntos no palco Emicida e Kamau, dois dos mais importantes MCs da cena, que vêm engrossando o caldo do rap na grande mídia, fazendo shows em todo o país e até mesmo fora do Brasil (Kamau se apresentou recentemente no Favela Chic, em Londres). “Esse momento é muito importante, morô?”, disse Emicida.

Os MCs se revezaram nas rimas, abrindo com “Hey Rap”, de Emicida, com Kamau e Jeffe dobrando, Nyack e Erick tocando. Seguindo no mesmo ritmo com “Resistência”, de Kamau, “E.M.I.C.I.D.A”, de Emicida, e a fala de Marcus Vinicius Kamau: “A gente é mais que Emicida e Kamau”.

O público eufórico foi o maior tempero da festa. Como presente para quem compareceu, vieram mais algumas canções da dupla da noite. “Sábadão (os embalos de…)” teve direito a dancinha de Kamau, DJ Nyack e Jeffe. Antes de “Triunfo”, uma das mais esperadas, Kamau, o MC que mais falou no palco, mandou mais um recado: “É uma honra fazer isso acontecer diante de todos vocês”. Em seguida, o recado para quem dedica o tempo para falar mal de tudo e de todos: “Komwé”. Logo depois, a homenagem a DJ PR!MO, que com certeza estava ali abençoando toda festa. Os MCs cantaram “A Quem Possa Interessar”, enquanto mostravam uma camiseta com o nome do DJ.

O Triunfo do público e uma página na história. Por Janaina Castelo Branco

O Triunfo do público e uma página na história. Por Janaina Castelo Branco

E então, o “N” (simbolizando o NOIZ) se levantou em mais um momento especial da festa. Foi vez do “Triunfo” de todos que compareceram e a confraternização de todos que se apresentaram pelo Festival Dialeto. Emicida, ao lado de Kamau, Jeff, Nyack, Erick e outros MCs que participaram do evento, fecharam a noite com “Eu Tô Bem”. (de Emicida) Espero que a noite de 10/10 seja o capítulo do livro de alguém sobre a história do rap nacional.

Clique aqui e confira mais fotos do Festival Dialeto feitas pelas fotógrafas do site NOIZ.


By Site Noiz

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