quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Entrevista com Thaíde, Um dos Melhores Mcs Brasileiros





Para Altair Gonçalves tudo começou na estação São Bento, dançando break, no início dos anos 80, quando fundou a Back Spin uma das primeiras equipes de dança da cultura Hip Hop do País. De b-boy o jovem passou para o microfone, do microfone para a televisão, da tv para o cinema, e hoje você o encontra até em curtas de animação. Sempre com rimas positivas e a humildade acima de tudo, Thaíde parece não ter limites e mantém atual um dos seus mais antigos versos:

"eu sou assim mesmo e nada pode me parar

*Texto por Marko Panayotis e João Pejan/ Video de Renato Góes


Em um rolê pela madrugada de São Paulo Thaíde trocou uma idéia com a FIRMA.


FIRMA: Na revista “FIRMA” temos histórias em quadrinhos, normalmente há um herói. O Peter Parker tomou uma picada de aranha e virou o Spiderman, o Bruce Wayne se transforma no morcego Batman. Como e quando o Altair Gonçalves virou Thaíde?


Thaíde: Quando ele começou a encarar a realidade de frente, a ver que o problema não era só dele, o problema não era só no bairro dele, ele começou a conhecer outros bairros, outras pessoas com o mesmo problema. Viu que onde ele podia chegar era limite imposto por alguém, que até hoje ele não sabe quem é, talvez fosse ele mesmo. Desde então ele começou a ultrapassar limites, da esquina foi até a praça, da praça até a outra rua, da outra rua até o outro bairro, foi chegando até o Centro da cidade e hoje está no País inteiro.


FIRMA: Você está produzindo e disponibilizando suas músicas na internet, como você vê a invasão do mp3? Você acha que essa é uma solução?


Thaíde: Eu acho que a música tinha que ser como água. A água também deveria ser de graça, mas alguém teve a idéia de engarrafar. A música também deveria ser de graça, mas alguém teve a idéia de vender, entendeu?Em um momento as pessoas estavam pagando muito caro por uma música, hoje não, você pode fazer um cd só com os sons que você gosta, não é mais obrigado a pagar 30 reais em um cd. As pessoas vão dizer que isso é apologia à pirataria, não é apologia, e se for também não estou me importando. Você debate com alguém sobre pirataria e vê na tv um comercial de reprodutor de cd que é vendido em qualquer loja de eletro-eletrônico, sua luta está sendo em vão.

As grandes gravadoras e multinacionais investiram muito nos seus artistas para ter lucro, para isso, colocavam o preço do cd lá em cima, e muitas pessoas que não tinham acesso compravam uma fitinha cassete e faziam cópias. Hoje isso acabou, não tem mais o monopólio das grandes gravadoras e para o artista de verdade é muito bom, portanto eu prefiro fazer música e jogar na Internet, ter essa independência musical é sem duvida nenhuma uma maravilha.Eu não vivo do dinheiro de venda de disco eu vivo de show, vivo do contato direto com o público, vivo do meu trabalho.


FIRMA: Como você acha que o rap nacional está se adequando à essa realidade da divulgação pela internet, sem gravadora?

Thaíde: O rap, assim como outros estilos musicais, não são bem vistos por algumas gravadoras no Brasil. Dessa forma, a internet veio como dizem os mais velhos “uma mão na roda”, pois se você tem uma idéia na cabeça, põe ela no computador, queima um cd e divulga pra todo mundo. Coloca no site, no MySpace e de qualquer parte do mundo a pessoa pode ouvir o som. O talento não depende da quantidade de dinheiro que a pessoa tem. Eu conheço gente que tem muito dinheiro e não tem talento, e conheço gente que não tem uma moeda no bolso e tem talento de sobra. Acabou esse papo de que tem que ter uma gravadora, acho que essa época já era.


FIRMA: A música Revolução diz “Você já enfrentou o sistema hoje?” Pra você, como é enfrentar o sistema?

Thaíde: A gente passou muito tempo querendo que as coisas fossem do nosso jeito, e a vida não é do jeito que a gente quer, ela é do jeito que é e pronto. Temos que ter certas estratégias pra lutar contra o sistema, pois quando falamos contra o sistema, acabamos até nos contradizendo um pouco, pois uma hora ou outra você se vê nas mãos dele, fazendo coisas que até então você combate.


FIRMA: Isso quer dizer que temos que jogar o jogo?

Thaíde: Não sei se tem que jogar o jogo, mas se você está na rua tem que enfrentar tudo que vem pela frente. Já foi a época de matar um leão por dia, hoje a maioria das pessoas enfrentam um zoológico por dia e nem percebem. Existem maneiras e maneiras, o sistema está em todo lugar, no tênis, na roupa, na comida, tudo que envolve dinheiro tem sistema no meio. E a gente trabalha pra ganhar dinheiro, gasta o dinheiro do jeito mais adequado, e tudo isso faz parte do sistema.

Eles dão um pouco e você fica contente, isso é errado, acho que tem que ficar contente sim, e saber que aquilo ali é o mínimo que ele nos devem. Nós fazemos parte desse jogo, somos peões de um grande tabuleiro de xadrez, mas graças a Deus o rei é limitado, só come a rainha e pronto (risos). E mesmo assim é outro que come a rainha, e ele se fode (risos).


FIRMA: Você está trabalhando atualmente com uma galera mais nova, de uma outra geração, o que isso acrescenta na sua vida e na música?

Thaíde: Todo mundo tem uma visão diferente. A minha idéia de conviver com pessoas mais jovens serve para eu também me manter jovem, para me manter na ativa, atualizado, pois tem gente com a minha idade (40 anos) e está cansada de muita coisa, encosta-se em um lugar pra descansar e não sai mais. Eu estou cansado sim, de muita coisa, mas não vou me encostar em algum lugar para não sair mais. Quero sair por aí, quero conhecer pessoas, conhecer coisas e saber o que está acontecendo. Quero permanecer sempre jovem.


FIRMA: Quais os sons que você está escutando atualmente ?


Thaíde: Atualmente estou ouvindoJackson do Pandeiro, Fernando Mendes, porque são pessoas que vieram muito antes de mim quando o mercado fonográfico brasileiro funcionava e o artista tinha que cantar de verdade. Tem um cara chamado Damião Experiença (risos), do Rio de Janeiro, que é louco de tudo, é interessante, pois quando me deparo com coisas bem feitas é melhor ainda, porque aprendo mais, independente do ritmo.


FIRMA: Você tem muito vinil?

Thaíde: Eu sou colecionador, gosto muito. Das músicas mais estranhas até as mais simples. Tenho muito vinil, só vinil podre, não tenho vinilzinho bonitinho (são poucos), a maioria está com as capas comidas por traça, embolorado, mas são os meus vinis. Não ponha as mãos neles (risos).


FIRMA: A revista Caros Amigos lançou duas edições especiais sobre Hip Hop, nas duas muitas pessoas se dizem influenciadas pela sua música. Como você lida com isso?

Thaíde: Acho que todo mundo nasce para alguma coisa, ninguém nasce só para dor de parto da mãe. Eu sempre falei pra molecada estudar, pois não estudei, dei uma sorte muito grande na vida, fui escolhido para fazer alguma coisa que gosto. Isso não quer dizer que todo mundo vai ter a mesma sorte que eu, por isso é importante estudar, pra ser melhor. Não tenho a pretensão de ser reconhecido como qualquer coisa além do que sou. Por isso o meu recente trabalho chama-se “Thaíde Apenas”, pois não quero ser mais e nem menos que isso. Só tenho que agradecer a presença de Deus, pois tudo tem acontecido de maneira positiva na minha vida.


FIRMA: Como foi cantar junto com Afrika Bambaata?

Thaíde: Tive esse prazer no festival Du Loco. Um festival que mostrou como eu ainda estou na ativa, pois sabia que iria acontecer, mas não estava envolvido diretamente nas atividades. Quando cheguei, vi que teria batalha de b.boys, batalha de mc’s, show do Afrika Bambaata e Grandmaster Flash. Acabei participando de tudo. Fui mediador das batalhas de mc’s, assisti as batalhas de b.boys, conheci os graffiteiros, dancei no palco, e rimei de improviso com o Afrika Bambaata e Soul Sonic Force.


FIRMA: Você sempre defendeu a profissionalização do rap nacional. Como acha que está a situação hoje?

Thaíde: Acho que está acontecendo de forma lenta, porém precisa. Tem muita gente inexperiente que está aprendendo com quem é mais experiente e vice-versa. Tem que perder o medo de conversar, existe um receio muito grande de um falar com o outro, de um ajudar o outro, mas um dia todo mundo vai embora, então porque vou guardar informação, seria egoísmo e idiotice. Acredito que a molecada de hoje está lendo mais, acessando a internet, buscando informações, e se profissionalizando. Tem muita gente cantando, fazendo passos de dança, e precisamos desse entretenimento urbano em todo o País, com todos os ritmos e estilos.


FIRMA: E como está a questão da união no rap?

Thaíde: Está melhorando a cada dia. Algumas pessoas tropeçaram na esquina e viram o erro que cometeram

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