quinta-feira, 23 de julho de 2009

Entrevista - 157 Nervoso, A Cria Rebelde




"A Cria Rebelde", CD do grupo baiano 157 Nervoso, produzido por DJ Leandro, Diego 157, Armeng e DJ Índio, reproduz um discurso político e suburbano sobre bases na linha do Rap alternativo. A subversão está no sangue de Diego 157, Man-duim e Spok, integrantes do grupo. Suas rimas vão além dos tiros e clichês sampleados por vários artistas da cena. Em entrevista ao Central Hip-Hop/BF, o 157 Nervoso fala sobre sua arte e sua visão política.


Há quanto tempo o grupo está na cena? A formação é a mesma do início? Qual o significado do nome do grupo?

Diego 157:
Nossos versos ecoam desde o ano 2000, quando paramos e decidimos que era Rap que nós queríamos fazer, a partir da nossa ótica. Temos nove anos de caminhada e de muito trabalho. A formação atual é Diego 157, Man-duim e Spok. O “157” é uma alusão ao artigo do código penal que corresponde ao assalto a mão armada. As armas que nós usamos são os mics, e a idéia do grupo é chegar e tomar de assalto Enquanto nós estivermos em ação num palco, o melhor de cada um vai ser doado para que a estratégia teórica funcione na prática, já o “Nervoso” vem da situação em que nossos semelhantes se encontram, a frase “muita calma nessa hora” se torna inviável quando uma minoria elitista domina e manipula a maioria da população que faz este país pulsar.

Em épocas de crise, a audiência do Big Brodher Brasil é monstruosa, na política os governantes não levam a sério as mesmas pessoas que depositaram uma confiança para que eles estivessem onde estão, a mídia sensacionalista ainda trata o Hip Hop com desdém e no Rap a cada nota decem reais, o compromisso que o Sabotage cantou vai se tornando mais um bordão. Por essas e por muitas outras situações é que nos fazemos presente.



Como é a cena hip hop da Bahia (shows, produções, eventos, grupos)?

Man-duim:
Existe gente com boas intenções voltadas para os shows e suas produções aqui em Salvador, posso destacar as festas Fora de Órbita Rap, Equilíbrio Musical, Coletivo Blackitude (em suas ações) e Subsolo, que é a festa que nós mesmos organizamos. Algumas festas daqui ainda pecam pela falta de estrutura, desde o ambiente para o público presente até os artistas que vão fazer suas apresentações. Isso enfraquece a cena. Grupos por aqui, como em qualquer outra localidade, tem de monte e dos que eu estou gostando de ver as apresentações são: Invés, Lukas Kintê, Versu2, Daganja e Sub-versivos. Existe muita coisa boa sendo feita por aqui, mas não dá pra competir com um mercado fonográfico totalmente voltado para o axé, entretanto, as produções com qualidade vão começar a aparecer com grande estilo.


Seu CD tem bases com influência da nova escola, mas suas letras são politizadas. Fale um pouco sobre a proposta musical do grupo e sobre suas rimas
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Spok:
Nossa influência para compor, cantar, viver cada rima, é o que esta em nós. É de dentro para fora, essa é a grande revolução do grupo. Daí vem o porque de ser politizado e realmente militar nas ruas. A proposta é trabalhar sendo sincero com o rap, com as pessoas que nos ouvem e, acima de tudo, com nós mesmos. A missão é fazer com que as pessoas que consomem nossa música sintam o que vivemos e compreendam o caminho que percorremos para entenderem qual é da guerra sacou? É isso, a raíz vive e o Hip-Hop respira.

Diego 157:
A proposta é fazer nossa música chegar sem nenhuma maquiagem e da melhor forma possível. É como o Marechal falou, se não for pra mudar vida, pra não trazer algo que venha a somar com produtividade de quem nos ouve, pra gente não vale.

Quais são suas referências dentro e fora do Rap?


157 Nervoso: Existem muitas coisas que nos influenciaram e ainda continuam influenciando, nomes como: KRS One, Wu Tang Clan, Mos Def, 2Pac, Big Pun, Talib Kweli, Notorius Big, Commom,Racionais Mc´s, Família RZO são algumas referências. Fora do rap, gostamos de Bezerra da Silva, Tim Maia, Djavan, Paulo Diniz, Bob Marley e Exaltasamba. No geral a boa música sempre nos inspira.

Com as várias mudanças no discurso dos MCs nos dias de hoje, no que o rap pode contribuir para a auto-estima dos negros e pobres?


Man-duim:
O Rap sempre teve esse papel de falar pelos seus semelhantes, por ser um elemento cultural do gueto e por noticiar o que se passa nele, enquanto muitos achavam que era musica de bandido, o próprio gueto sabia que era apenas uma narrativa do que acontecia, os versos mostravam quem são nossos verdadeiros inimigos. O rap buscava/busca apontar soluções de como nos defender desse inimigo, através da arte e da música, para atingir quem oprime com um diploma ao invés de uma arma em punho.

Spok:
O Rap contribui com a palavra, creio que há poder na mensagem, uma letra diferenciada desperta a real em quem quer que seja. Malcolm X despertou a auto-estima de muitos irmãos com a verdade. Martin Luther King fez isso, o Racionais fez isso com “Um homem na estrada”. Hoje somos a continuação dessa militância através do nosso Rap. Muitos não entendem o poder que há em ser um MC, nem o valor e a emoção que é salvar uma vida do crime, do crack. Isso é amor ta ligado? Isso é discurso fundamentado em verdades. A partir do momento em que se tem um microfone em mãos e há transmissão de mensagens, quer queira quer não, nos tornamos formadores de opinião e, por isso, é muito importante ter cuidado com o que se diz. Eu não condeno quem muda o discurso, existe livre arbítrio para se cantar, só peço que continuem sendo sinceros para consigo mesmo, porque o jogo é traiçoeiro e às vezes certas atitudes soam como vergonhosas. Ultimamente tem sido lamentável o que temos ouvido de alguns rappers.

Diego 157:
A verdadeira história precisa ser mostrada e o rap jamais deve se omitir, o Brasil é racista, a televisão é racista e a minoria elitista que detém o domínio de diversos meios também é racista, nossa contribuição é alertar os nossos que não vivemos no país das maravilhas de Alice. Precisamos ser dez vezes melhores do que o ontem. A pobreza existe e muitas das famílias que vivem em condições miseráveis não sabem nem qual a razão disso tudo.


Como vocês encaram a profissionalização do Rap? Qual a sua opinião sobre a falta de circulação da grana entre os que são do Rap?

Diego 157:
A profissionalização no Rap é como se ter flow e idéia, se você não tem, o futuro não vai ser tão promissor como o seu vizinho falou. A partir do momento que o grupo busca ser o mais profissional possível, o respeito com o mesmo vai se tornando mais explícito. É preciso saber dizer não e dialogar com dignidade frente as propostas que por ventura venham a aparecer. E a questão da falta de grana que é o maior problema no meu ver, eu ouço um monte de MC com o mesmo discurso “...eu quero dinheiro...”, parecem até os pedintes que encontramos pelas ruas, pra mim o dinheiro vai faltar até que os bons trabalhos sejam apresentados, quando as boas propostas forem tiradas do papel. Enquanto isso, segue o barco. Como o Mamelo Sound Sistem cantou “quem é de verde sabe quem é de mentira”.

Spok: É aquele lance, a idéia é se movimentar, não ser profissional de fachada, saber o que se quer e que o bagulho que você está inserido é música rap. E pra música fluir com uma sonoridade de qualidade, é preciso ter grana. O investimento é imprescindível para o trabalho circular e poder chegar a diversas localidades e atingir os mais variados públicos. O que a acontece muitas das vezes é que entre os que são do rap, de dez apenas um trabalha certo. Assim fica uma impressão de que os protagonistas que se doam pro ritmo ainda são imaturos. Então, uma firma pra andar necessita de bons funcionários e aquele que desempenhar da melhor forma o trabalho é o que mais mérito terá.

Man-duim:
Precisamos ser profissionais em tudo que estamos envolvidos, seja na música ou em qualquer outro seguimento. Tudo o que não segue um padrão pré-estabelecido sofre de alguma maneira e com o Rap não seria diferente, hoje quem está no Rap sabe que: ou se faz música pra entrar no jogo de quem tem poder nas mãos e se fantasia de “rapper do momento” ou se sustenta os ideais e morre com dignidade.


A busca pela profissionalização e o ideal do capitalismo selvagem andam juntos? Se andam, quem tem menos recursos será vítima da seleção natural do movimento Rap?


Spok: A busca pelo profissionalismo nós estamos vivendo por aqui, e os investimentos vão dar conta de um retorno... por que nosso suor não pode e nem vai ser em vão. O rap tem que fazer a grana girar, formar produtores, DJs, tudo isso. Muitos gringos estão colhendo o que semearam. Eu acho que quando se trabalha de verdade o lado, quando se estuda música Rap sem tomar conhecimento de barreiras, você pode chegar a um certo ápice e trazer dimensão ao seu trabalho. O problema é que quem quer muito e vive sem os pés no chão, no final pouco leva, existem muitos com poucos recursos que estão e vão representando por aí Brasil afora. São gigantes diante as gravadoras. O maior de tudo é a alma ela é insuperável.

Diego 157:
Infelizmente quem não estiver com os mínimos requisitos para apresentar um trabalho de qualidade vai ser vitimado, a cada dia que passa o processo de aceitação fica ainda mais seletivo e se você não tem um beat bom, uma boa letra e um bom flow, vai perder pra quem tem tudo isso. A máxima do capitalismo é de um indivíduo se sobressair sobre outro, isso é em qualquer lugar não só na música. Nós não criamos regras nenhuma, aliás somos até vítimas da mais-valia, trabalhamos demais e os retornos ainda não compensam, mas estamos nesse jogo para darmos a cartada certa e na hora certa.

Fonte - Central HH

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