Como jovens com nomes de origem africana driblam situações de deboche e preconceito e, ainda assim, se mantêm orgulhosos
Tenka Dara e suas filhas Mimbi e Iaomim: tradição familiar mantida |
No início, Ayo Shani sofria muito com as piadas e apelidos, agora, "Tenho orgulho do meu nome" |
Carlos, Luiz, José, Francisco, Ricardo e Silvia. A primeira chamada do ano letivo, no qual muitos alunos fazem a primeira ligação do nome à pessoa, é um ato corriqueiro na trajetória dos estudantes brasileiros. É momento de trocar os primeiros olhares com os colegas e começar a formar laços de amizade. No entanto, quando a professora, de forma insegura, clama por Tenka Dara, a sala se envolve em um clima de estranheza, geralmente seguido por deboches, cochichos e piadas. Essas foram cenas comuns nos primeiros dia de aula de Tenka Dara Pinho, de 32 anos. "Na escola não foi fácil carregar a escolha dos meus pais, um nome tão diferente. Ganhei vários apelidos como 'penca' e 'vem cá', enquanto outros alunos faziam trocadilhos como tem caderno, tem caneta, tem cadeira", relembra a paulistana, radicada no Rio de Janeiro. Uma das filhas do músico e ativista Antonio Carlos "TC" Santos Silva - que batizou seus herdeiros com nomes de origem africana e inglesa, Tenka aprendeu, ainda pequena, a lidar com as brincadeiras e as atitudes desrespeitosas de colegas de classe. "Aprendi a não dar ouvidos às brincadeiras. Essa é a melhor maneira de anular o efeito delas. Quando o desprezo não funcionava, partia para argumentação e levantava discussões sobre a diferença. Uma coisa boa foi aprender ainda pequena a me defender com argumentos."
MEU NOME, MINHA IDENTIDADE Raiva! Essa foi a palavra encontrada por Chindalena para resumir seu sentimento, quando, no primeiro dia de aula em sua nova escola, um colega de classe, por quem ela havia simpatizado, riu de seu nome. "Eu senti muito por simpatizar com um menino interessante, mas tão babaca". Segundo Andreza Gava, psicóloga comportamental-cognitiva, esse tipo de comportamento debochante é considerado bullying e pode trazer transtornos que prejudicam a criança, dentro e fora da sala de aula. "Na escola, as crianças buscam ser aceitas pelos colegas e, justamente neste ambiente, se deparam com os maiores desafios. Existem crianças que, para atrair a atenção dos demais, fazem uso de imagem negativa de alguns alunos. Nomes diferentes daqueles considerados padrão no ambiente escolar podem contribuir para o bullying." Ainda de acordo com a especialista em estresse, os pais que escolhem nomes diferenciados têm um papel de extrema importância na formação do caráter das crianças, já que são vistos como exemplo pelos seus filhos. "Pais que demonstram orgulho pela sua origem e raça, por si só, já são modelos de como os mesmos devem se defender do mundo, se portar perante as diferenças. É importante que os filhos saibam a origem e o significado do nome, pois isso os ajuda a ter 'argumentos' diante de piadas", adverte Andreza. |
Kimba, de 11 anos, nova geração e velhas brincadeiras |
A educadora Chindalena Ferreira Barbosa, moradora de São Paulo, é outra brasileira que tem em seu registro um nome tipicamente africano e que lhe rendeu momentos marcantes no colégio. Ao ser transferida para uma nova escola, Chindalena recebeu um conselho de sua mestra. "Mudei de escola na 5ª série. A professora estranhou meu nome e sugeriu me chamar de Lena que, diante da vergonha do primeiro dia numa turma diferente, aceitei. Mas, como nunca havia sido chamada assim, acabava não atendendo a professora", relata. "Ainda hoje, em qualquer lugar onde me apresento, as pessoas estranham, mas já estou tão acostumada e tiro essa situação de letra", afirma Chindalena, que atua na coordenação de projetos da Associação Frida Kahlo. Tenka Dara e Chindalena - nascidas respectivamente em 1979 e 1981 - são de um tempo em que o conservadorismo de alguns cartórios impedia que pais registrassem seus filhos com nomes diferenciados. Embora hoje estejamos em pleno século 21, nomes de origem africana ainda causam estranhamento.
Kimba Xavier, de 11 anos e irmão mais novo de Tenka, também teve que aprender a lidar com as brincadeiras e provocações logo cedo. "Kimba foi o nome que meu pai deu. No começo, eu ficava bravo quando os meninos da escola me chamavam de Simba, do Rei Leão", diz o caçula da família. No caso do menino morador de Campinas, São Paulo, não é raro as pessoas questionarem se Kimba é seu apelido ou nome. E, embora remeta ao continente africano, é de origem inglesa. Aos oito anos, quando descobriu que uma atleta de Trinidad e Tobago tinha o mesmo nome, Kimba disse que queria trocar o seu. "Expliquei para ele e dei vários exemplos de nomes unissex", brinca sua mãe, Denise Xavier.
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